I
No artigo anterior, comparámos a rede portuguesa de auto-estradas com as de outros países da Europa e concluímos, designadamente, que Portugal está no topo da União Europeia neste domínio.
Mas será um facto do qual nos devamos orgulhar (como entendem alguns) ou é antes um facto do qual nos devemos envergonhar (como entendem outros)?
Muita gente reage com perplexidade quando se critica que Portugal tenha quase 3 mil quilómetros de auto-estradas e que esteja prestes a acrescentar mais 500 quilómetros à sua já extensa rede: «como é que pode ser mau termos uma “excelente rede de auto-estradas?”», pergunta-se.
Todos temos mais ou menos noção da importância que as vias de comunicação têm tido ao longo da história. Cidades houve que se desenvolveram junto a portos (exemplos: Lisboa e Porto / Gaia), no cruzamento de caminhos e estradas (exemplo: Viseu) ou no entroncamento de linhas férreas (sendo o exemplo mais flagrante a cidade do Entroncamento). Não há economia que possa prosperar sem boas infra-estruturas de transporte, através das quais seja possível fazer circular, sem grandes constrangimentos, os bens produzidos.
Todos temos também uma percepção nítida da grande mudança que as auto-estradas trouxeram em termos de mobilidade no nosso país, com um significativo encurtamento das distâncias-tempo - que, aliás, está longe de ser surpreendente, sobretudo se pensarmos que tínhamos uma rede de estradas nacionais lenta e em grande parte mal conservada.
Estas duas circunstâncias explicam, em grande medida, a grande aceitação que as auto-estradas têm tido entre os portugueses.
Mas se nos ficarmos por aqui na avaliação do esforço português de construção de auto-estradas estaremos a ver apenas uma parte da realidade.
Um dos problemas básicos na análise custo / benefício das auto-estradas é comparar-se a auto-estrada apenas com a realidade preexistente, e nunca se fazer a comparação com uma boa alternativa a ela – e não estamos agora a pensar apenas na ferrovia (que será referida adiante), mas sim numa boa estrada. Assim, se compararmos a A24 (Viseu–Chaves) com o percurso rodoviário que existia anteriormente (a Estrada Nacional 2), torna-se muito mais fácil encontrarmos vários benefícios na construção daquela auto-estrada. Tem sido este o tipo de caminho trilhado por quem tem governado o nosso país nos últimos 25 anos, com o apoio expresso ou o silêncio mais ou menos cúmplice dos autarcas locais (de todos ou de praticamente todos os partidos) e a satisfação do povo.
E, no entanto, decidir-se construir uma auto-estrada sem se considerarem previamente outras alternativas (e sem se fazer a análise custo / benefício tendo também em conta essas alternativas) é algo que, no mínimo, nos devia deixar perplexos, ou não fosse o nosso país um país com uma economia débil e cheio de carências em inúmeras áreas, da saúde à cultura, passando pela justiça e pelo ensino, só para citar alguns exemplos.
É que as auto-estradas são muito caras, quando comparadas com as outras estradas. Implicam maiores exigências em termos de construção e de traçado. Exigem elevadíssimos custos de investimento e maiores custos de exploração e de conservação. Só a auto-estrada Amarante–Bragança (presentemente em construção) está a custar-nos mais de 850 milhões de euros (mais de 5,2 milhões de euros por quilómetro, se não houver derrapagens), e isto considerando apenas os custos de construção previstos: os avultados prejuízos para o erário público associados à sua exploração vão prolongar-se pelas próximas décadas, afundando ainda mais um país já muito endividado (com as consequências que estão à vista de todos).
Há casos em que foi acertada a decisão de construir uma auto-estrada: não estamos a sugerir que o país não devesse ter auto-estradas. Mas em relação a uma parte bastante significativa da rede é lamentável que não tenha sido considerada uma alternativa mais barata [isto esquecendo por ora os casos em que pura e simplesmente nenhuma nova via devia ter sido construída].
A alternativa à construção de uma auto-estrada não tem de constituir necessariamente uma estrada sinuosa, com mau piso e que atravesse dezenas de povoações. Em lugar de uma auto-estrada, pode, por exemplo, construir-se uma boa via rápida, bem projectada, sem os disparates construtivos que tinham, por exemplo, alguns troços do IP5 (declives muito acentuados e curvas apertadas). Provavelmente não há melhor exemplo que possa ser citado: o troço do IP2 entre São Manços (perto de Évora) e as proximidades de Beja é um exemplo de uma boa via rápida, bem projectada e bem construída, onde é possível conduzir, em segurança, à velocidade máxima permitida (100 km/h), não obstante a existência de alguns desníveis no traçado – nos quais se construiu (e bem) uma segunda via para veículos lentos – e de alguns cruzamentos de nível (que podem ser suprimidos). Não é apenas um exemplo de uma boa estrada: é também um exemplo de como teria sido um completo disparate a construção no seu lugar de uma auto-estrada, aumentando um pouco a velocidade de circulação e diminuindo ligeiramente os tempos de percurso.
Uma estrada (uma boa estrada) pode, nos troços onde isso se justifique (e apenas nesses), ter duas faixas de rodagem em cada sentido: há inúmeros troços de estradas nacionais em Espanha ou em França, por exemplo, onde isso sucede. Na óptica do utilizador, não se distinguem muito das auto-estradas propriamente ditas, a não ser na velocidade permitida, que é um pouco mais baixa (geralmente, 20 km/h mais baixa, como sucede em Portugal com as vias reservadas a automóveis, onde a velocidade máxima é de 100 km/h). Noutros casos, a estrada pode ter pequenos troços de duas faixas regularmente distribuídos ao longo do seu trajecto, de modo a possibilitar ultrapassagens mais seguras.
A única alternativa a uma auto-estrada não é, portanto, uma estrada lenta, sinuosa ou com características urbanas.
E nesse caso as coisas mudam de figura.
E mudam de figura, desde logo, relativamente ao primeiro dos grandes benefícios que são apontados à auto-estrada: o conforto do utilizador e a diminuição dos tempos de deslocação.
Se o conforto na deslocação em auto-estrada não é muito diferente do de uma viagem numa boa estrada (nos termos já explicados), é de notar, de qualquer modo, que, por si só, nunca justificaria um tão elevado investimento num país que não é rico.
E quanto aos tempos de deslocação?
(continua)
Nota: este artigo não pretende, obviamente, constituir um estudo de custo / benefício das auto-estradas portuguesas. São apenas algumas reflexões, feitas por uma leiga (seguramente com falhas de análise), e não passam disso.
12 comentários:
Meninas: sabem que é errado, ortograficamente falando, usar «negritos»?
Porque José?
Porque não existe tal coisa na ortografia portuguesa, quando se pretende realçar uma parte do texto, mandam as regras ortográficas que se utilizem as «aspas portuguesas» ou em itálico.
Realmente depois de um artigo tão bem escrito, o melhor a fazer é criticar o uso de «negrito»...
Parece-me que ninguém está a criticar, é simplesmente uma observação construtiva.
Pulso rápido a julgar... Muita intranquilidade neste blog.
"quando se pretende realçar uma parte do texto, mandam as regras ortográficas que se utilizem as «aspas portuguesas» ou em itálico. "
Não é isso que o «Ciberdúvidas da Língua Portuguesa» diz...:
http://ciberduvidas.sapo.pt/pergunta.php?id=12957
http://ciberduvidas.sapo.pt/pergunta.php?id=22422
http://ciberduvidas.sapo.pt/pergunta.php?id=27814
http://ciberduvidas.sapo.pt/pergunta.php?id=27432
Não sei o que diz o «Ciberdúvidas da Língua Portuguesa», nem se quer vou ver; querem aprender, aprendam; querem teimar no erro: boa sorte!
José, e pode-nos indicar quais as suas qualificações para nos vir aqui ensinar?
É que das pessoas do «Ciberdúvidas da Língua Portuguesa» estão lá todas. E olhe que não são poucas.
Mas obrigado pelo tom paternalista.
Não vou certamente facultar o o CV a uma pessoa que nem se digna a assinar os seus comentários.
Por mim está encerrado o assunto.
Ó homem, quem se veio para ficar armar que sabia muito do assunto não fui eu. Se quer fazer figura de gajo que tem a mania que sabe tudo mas depois não diz porquê, olhe faça-o à vontade. É só mais um troll, coisa que neste blogue há aos montes.
Por mim também já estava encerrado o assunto há muito tempo. Já estudei o suficiente a Língua Portuguesa para saber o que se pode usar ou não para realçar o texto (e olhe que quando me ensinaram isso disseram-me porquê, não fizeram como o José que diz que é assim porque o José diz que é assim). Queria era saber porque é que o José diz que não se pode. Não quer dizer, paciência.
Passe bem.
Obrigado!
José, obrigada pelo reparo. Estamos sempre a aprender e os artigos deste blogue terão seguramente muitos erros gramaticais (pelo menos sempre tentamos falar português...).
Neste caso, não me parece que o reparo seja acertado. Aconselho, por exemplo, a consulta do excelente "Nova Gramática do Português Contemporâneo", de Lindley Cintra e Celso Cunha - gramática que, aliás, usa e abusa do negrito (quase não há uma página sem ele...).
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